14 de junho de 2025 - 18:43

Acho (só acho!) que estão brincando com a sua esperança. De novo

Caro leitor,

Um ministro do Supremo Tribunal Federal. Não, mais do que isso. O decano do Supremo. O homem que manda tanto, tanto, tanto que manda até na CBF. Sim, estou falando dele mesmo, Gilmar Mendes. O ministro Gilmar Mendes perdeu qualquer resquício de pudor e, falando em nome dos demais ministros da Corte, que não o refutaram, disse que todos ali eram são admiradores de Xi Jinping.

Disse mais, Gilmar Mendes. Citou um aforismo cujo teor acho que não foi devidamente esmiuçado pelos analistas que tenho lido. “Não importa a cor do gato, o que importa é se ele sabe caçar ratos”, diz a frase, que na verdade é de outro líder comunista chinês, Deng Xiaoping – como corrigiu de pronto o mui culto presidente do STF, Luís Roberto Barroso. Para você ter uma ideia, Xiaoping foi quem ordenou o Massacre da Paz Celestial.

Sanções e Lei Magnitsky

Para além da gravidade que é citar Xi e Deng e confessar sua admiração por um regime assassino e controlador, o dito em si chama a atenção porque evoca uma lógica utilitarista e consequencialista. É a versão sábio-chinês da máxima maquiavélica segundo a qual “os fins justificam os meios”. Por mais inconstitucionais, antiéticos, anticivilizatórios e até anticristãos que sejam esses meios.

Assistindo à cena e ouvindo essas palavras, me lembrei prontamente de certo influencer que vive de atiçar a esperança da direita. O nome dele você pesquisa aí. Está cheio. Não, não é esse. É outro. Esse sujeito específico em que estou pensando agora é o das 72 horas, do tique-taque, da bala de prata, da bomba, do urgente, e, mais recentemente, das sanções e da lei Magnitsky.

Peteca

É alguém que vive de brincar com a esperança da direita. Com a sua esperança. É alguém que vive de manipular a indignação, de atiçar o desejo imediatista de revolução, de anunciar uma virada de mesa, de te fazer acreditar que ele tem informações privilegiadíssimas e tudo-será-resolvido-num-passe-de-mágica. E, quando você abrir os olhos, estará vivendo num Paraíso direitista. Ou conservador. Ou bolsonarista. Sei lá.

Ora, até entendo que alguém tenha que ficar ali na beirada do campo incentivando os jogadores a não deixarem a peteca cair. Mas essa é uma função que, se não for exercida com o máximo rigor ético, vira perversidade. Vira sadismo e irresponsabilidade. Porque tem gente deprimida e desesperada. Gente que não aguenta nem mais um revés – e infelizmente o futuro promete muitos.

Óinc, óinc

Mas o pior nem é isso. O pior é que tem quem goste de ser ludibriado. Tanto é assim que, sempre que alguém clama por razão, bom senso e um pouco de calma e paciência em meio a esse caos de falso otimismo e esperança, esse alguém é chamado de invejoso, de pessimista, de estraga-prazeres, de derrotista. Pronto. Taí. Te poupei de ter de fazer um comentário ofensivo.

Não sou nenhuma dessas coisas. Ao menos não me vejo assim. Espero que não seja. Só acho que os mercadores de falsas esperanças deveriam ser cobrados por cada (óinc, óinc) factoide que nos induz à crença eufórica de que em breve estaremos livres da caquistocracia que nos governa. Mas, talvez porque nos dê prazer ansiar pelo inesperado que nos tirará desta situação logo, amanhã, hoje, vamos deixando passar. E tome bomba!, tique-taque, sanções, lei Magnisty e o escambau.

Inverno do nosso descontentamento

Mas, por favor. Leia isso tendo em mente que sou desses que acreditam que viverão para ver certas pessoas condenadas a cem anos de prisão por, no mínimo, abuso de autoridade. Além do mais, confesso que não sou imune ao otimismo irracional e por isso volta e meia também me pego acreditando nessas esperanças tolas. Ou seja, compreendo muito bem o pico de dopamina que elas causam em quem tem sede de justiça.

O problema é que, depois de ver o decano do Supremo declarando seu amor ao que o regime comunista chinês tem de pior, e falando em nome dos demais ministros, ainda por cima, me sinto na obrigação de te dizer pra ir com calma, não se animar muito, se preparar para o tranco e economizar nas expectativas. Porque, com esse STF que está aí, será longo, frio e escuro o inverno do nosso descontentamento.

Um abraço melancolicamente solidário do
Paulo

noticia por : Gazeta do Povo

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