Vi um indignado ex-presidente Jair Bolsonaro dar um pito no senador Marcos Pontes, que ousou desobedecer o líder e se lançar candidato à Presidência do Senado. No que faz muito bem, aliás. Pontes, mais conhecido como Astronauta, concorre com Davi Alcolumbre, que tá com Lula e não abre – e cujo apoio Bolsonaro justifica como uma improvável tacada de mestre.

Disse o ex-presidente que, no caso de derrota de um candidato próprio, a grande tragédia para a direita seria ficar sem comissões que permitissem aos senadores emplacar uma ou outra pauta conservadora. Por isso ele está apoiando Alcolumbre: para viver das migalhas que possam cair do confuso caldeirão regimental do Legislativo brasileiro. E se você não concorda com essa postura, se prepare para enfrentar toda a fúria do dono da direita.

Até aí, tudo bem. É do jogo e do espírito fisiológico de um Bolsonaro que aprendeu a fazer política com o Centrão. A coisa complica, ou melhor, a coisa ganha contornos cômicos quando o próprio Bolsonaro explica a grande estratégica por trás do apoio a Alcolumbre – grande parça de Randolfe Rodrigues e representante do pujante estado do Amapá. A ela, pois.

“Estamos negociando a primeira-vice-presidência. Você pode, em uma ausência do Alcolumbre, botar em votação a anistia…”, explicou Bolsonaro em entrevista à revista Oeste. E eu tive que ler mais de uma vez para acreditar no que meus olhos estavam lendo. Na ausência do Alcolumbre, na ausência do Alcolumbre, na ausência de Alcolumbre…

Então quer dizer que essa é a esperança da direita? Que Alcolumbre tenha, sei lá, um piriri e precise se ausentar? Enquanto isso o vice, sorrateiramente, sem negociação e nenhuma chance de vitória, e sem levar em conta o ativismo do STF, vai lá coloca a necessária pauta da anistia ou o impeachment de Alexandre de Moraes em votação? Uau. Como ninguém pensou nisso antes?!

Esse plano politicamente medíocre e fadado ao fracasso é bem coisa de quem insistiu em dizer que jogava dentro das quatro linhas e agora corre o risco de ser preso por tentativa de golpe. Ou de quem xingou Alexandre de Moraes de “canalha” para logo em seguida divulgar cartinha pedindo desculpas. Etc.

Diante da justificativa, digamos, pouco inspirada para apoiar Davi Alcolumbre, isto é, as muitas possibilidades (ahã) que a oposição terá de impor sua pauta quando da ausência dele, fico me perguntando se passam pela cabeça de Bolsonaro e da direita pragmática todos as pautas nocivas que Alcolumbre poderá avançar como presidente do Senado.

Ou será que o plano da direita é manter o senador amapaense com um piriri eterno que o impeça de fazer tudo aquilo que, tenho certeza, Alcolumbre já está negociando com Lula, Zé Dirceu, Renan Calheiros, Randolfe Rodrigues, Barroso, Moraes, Dino,…? Se for isso, coitado do Brasil. Coitada da liberdade de expressão e da imunidade parlamentar (ou melhor, do que resta delas). Coitados dos presos de 8/1.