12 de junho de 2025 - 5:04

O anel que tu me deste

O sinal tinha acabado de tocar e eu não espera vê-lo assim, ajoelhado, propondo compromisso tão sério antes da merenda. Fazendo deslizar pelo dedo certo da minha mão direita —ai, que vergonha, na época eu roía unha— um precioso anel de ouro com rubi, daqueles que vinham de brinde no doce mais vagabundo da cantina.

“Quer namorar comigo?”, perguntou, com toda a pompa e circunstância de um guri de seis anos. Indagando também, como quem exige contraprova de amor, se eu estaria disposta a partilhar com ele não só o lanche daquele dia como dos demais. Na alegria e na tristeza, na catapora e no sapinho, por todas as jujubas da minha vida, incluindo as laranja, de que ninguém gostava, amém.

Lembro perfeitamente das risadas dos meus pais, achando tal noivado uma gracinha, e dos muxoxos da minha avó, que previa toda essa doçura infantil terminando em conta altíssima do dentista.

Não sabia eu, àquela idade, dessa máxima consagrada nos poemas, nas inscrições em troncos de árvores, nos papeizinhos de biscoito da sorte e nos bilhetes de Dia dos Namorados: “Jamais se supera o primeiro amor”.

De minha parte, eu não buscava um pai para minhas bonecas nana-nenê. Gostei de receber um telefonema em nosso primeiro 12 de Junho, bem como convites para matinês de filmes dos Trapalhões. Com o tempo, porém, fui me sentindo sufocada pelas cobranças de casal. Como assim, a primeira fatia do aniversário tinha que ser para ele? O bolo em formato de Mickey feio era meu, ninguém mandava em mim. Ai de quem regulasse com quem eu pulava elástico ou trocava papel de carta. “Vai bater bafo com seus amigos, vai”.

Obrigados a calçar luvas brancas e a desfilar pelo bairro no 7 de Setembro, me lembro de cantar o hino por entre dentes enquanto ele tentava marchar de mãos dadas. Um gesto até pacifista, em se tratando da ditadura imposta à nossa vida escolar. No entanto, a chama de uma pequena revolução já crescia dentro de mim.

Do alto da gangorra do pátio, altiva em minhas resoluções mirins, anunciei estar tudo acabado entre nós. O que o fez tombar do brinquedo, com direito a atendimento na enfermaria e pontos no supercílio. No meio da confusão, o anel de noivado, que era vidro, se quebrou —igualzinho à ciranda. “Amar dói”, pensei. E penso até hoje. Porque, contrariando todas as máximas, todas as figurinhas de chiclete, semanas depois ele já estava enrabichado pela menina mais chorona da turma, que ainda fazia xixi na calça.


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noticia por : UOL

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