9 de março de 2025 - 19:40

Livro sobre a 'Família Soprano' é também uma ode à crítica de televisão

Lançada no longínquo ano de 1999 e finalizada há quase 18 anos, “Família Soprano” segue entre as maiores séries já feitas. Ousada, imprevisível, iconoclasta em relação a inúmeras regras que os canais de TV seguiam até então, a criação de David Chase é um pilar da chamada era de ouro da televisão americana.

Olhando em retrospectiva, o impacto da série sobre um chefe mafioso que busca ajuda terapêutica para enfrentar crises de pânico foi tão grande que influenciou a própria maneira de se enxergar a televisão, vista até então como uma mídia de qualidade muito inferior ao cinema.

“Sopranos” está no centro de uma revolução que elevou a ambição das produções, levou diretores e atores de Hollywood a migrarem para a TV, inspirou produções que vieram depois e mostrou que o espectador estava disposto a refletir sobre o que via na tela.

Esse lugar ocupado pela série parece hoje à prova de contestações. Mas não foi um caminho sem críticas, dúvidas e dificuldades, como relatam os críticos Alan Sepinwall e Matt Zoller Seitz no livro “Família Soprano: Menu de Episódios”, um catatau de 576 páginas, lançado originalmente em 2019 e publicado agora pela Darkside.

Na primeira parte da obra, eles esmiúçam a série episódio por episódio, do primeiro ao 86º, como se fossem anatomistas, revelando bastidores e chamando a atenção para aspectos aparentemente laterais ou secundários deles, como figurinos, trilha sonora e edição. É uma atenção aos detalhes que pode parecer obsessiva, exagerada, mas ajuda o espectador a entender o que havia de tão diferente na série.

No capítulo sobre o piloto, exibido pela HBO em 10 de janeiro de 1999, a dupla de críticos resume: “É um híbrido de comédia pastelão, sitcom familiar e suspense policial, com pitadas da garra da nova Hollywood dos anos 1970. É alta cultura e cultura de massa, vulgar e sofisticada”.

E acrescentam: “É uma série que fornece ao público todas as traições e assassinatos que ele espera de uma narrativa sobre a máfia, mas também psicoterapia e interpretação dos sonhos; sátira econômica e social; comentários sobre masculinidade tóxica e opressão patriarcal; e uma rica intertextualidade, que posiciona ‘Família Soprano’ em outro patamar em relação às histórias reais e cinematográficas de gângsteres, de ítalo-americanos e dos Estados Unidos”.

O coração do livro é esta análise episódio a episódio, mas a sequência não é menos atraente para o fã. Os dois críticos transcrevem um longo diálogo que tiveram sobre a cena final. Tony, vivido por James Gandolfini, foi assassinado ou não pelo homem que o observa no restaurante onde vai jantar com a família? No início da conversa, Sepinwall diz acreditar que o mafioso foi morto, no que é contestado por Seitz. Ao final de 12 páginas, as posições dos autores estão totalmente mudadas.

Os autores também reproduzem sete entrevistas (ou “sessões”) com David Chase realizadas entre setembro e dezembro de 2017. É uma conversa que entra em detalhes até sobre o que os personagens pensavam e faziam fora de cena.

A certa altura, Chase se refere à cena final como “a cena da morte”. Os autores riem do ato falho. Segue-se um silêncio até que Chase fala um palavrão e também ri. O máximo que ele diz sobre o assunto é que “todos nós podemos ser assassinados num restaurante”.

“Família Soprano: Menu de Episódios” é, também, uma celebração sobre a importância da crítica de televisão. Tanto Matt Zoller Seitz quanto Alan Sepinwall escreveram sobre a série enquanto críticos do “The Star-Ledger”, o maior jornal de Nova Jersey, que em fevereiro deste ano deixou de circular em versão impressa. Em muitas cenas, Tony Soprano aparece lendo o diário de notícias.

Zoller e Sepinwall também assinam em dupla “TV: The Book”, no qual analisam as cem melhores séries da história. Sepinwall, em particular, é um crítico de TV puro sangue, apaixonado e sem preconceitos. Desde 2018, é crítico da Rolling Stone, além de manter uma newsletter na qual trata de todas as novidades do meio.

É um mestre do “recap”, como os americanos chamam os textos que descrevem em detalhes, mas sem spoiler, o que aconteceu em um episódio de determinada série. Seus textos, de fato, ajudam a iluminar a arte de ver TV.

noticia por : UOL

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