6 de fevereiro de 2025 - 7:19

Americanos fazem contra os EUA o que inimigos não fizeram: o colapso Trump

Qualquer dessas alternativas é perturbadora. A impressão que começa a se generalizar mundo afora é a de que o presidente dos EUA não está muito bem da cabeça — não me parece que tenha estado algum dia completamente no controle de si mesmo — e, para arremate dos males, anda cercado de outros arruaceiros, a exemplo de Elon Musk, que fazem coisas estranhas. Os analistas são tentados, e eu mesmo sou assim, a ver método na sandice. Será? Por mais que se tente emprestar alguma racionalidade, ainda que de exceção, a esses 16 dias de governo, é impossível estabelecer um padrão.

“Ah, é tigre de papel; fala muito e não faz nada”. No embate tarifário, houve recuos, em princípio temporários, em relação ao México e ao Canadá. No caso da China, a imposição de restrições foi menor do que se anunciava, já respondida pelos adversários. O que ninguém consegue explicar — e não há leitura mesmo inconvencional que o faça — é a sua determinação de atingir primeiro os aliados. Há uma unanimidade entre analistas progressistas e conservadores: o presidente dos EUA está estremecendo a aliança dos países ocidentais, o que inclui aliados em todo o mundo, e fortalecendo a China. Pergunta óbvia de resposta idem: por que os que agora estão sendo intimidados ficariam à mercê de suas vontades num mundo multipolar?

A ideia infantil que Trump vendeu em sua campanha eleitoral e que reiterou em seu discurso de posse, segundo a qual, em vez de taxar americanos para enriquecer os outros países, vai taxar os outros países para enriquecer os americanos, é o quê? Uma teoria econômica? Não. Uma teoria geopolítica? Não. Uma teoria de economia política? Também não. Então é o quê? Só uma besteira.

Sim, Trump adotou teses bisonhas que embalavam os grotões republicanos, como demonstra Julian E. Zellzer na revista “Foreign Policy”, em artigo intitulado “Trump’s Not a Renegade – He’s a Loyal Republican Fighter“. Ou: “Trump não é um renegado; ele é um real militante republicano”. Em muitos aspectos, é mesmo: a obsessão pelo petróleo; os valores conservadores sobre família e religião, ainda que os tenha tomado apenas de empréstimo; o discurso localista, isolacionista e anticosmopolita… Tudo isso satisfaz as alas mais reacionárias do partido. Mesmo a sua conversa sobre tarifas alimenta a xenofobia dos rincões do atraso.

Mas e todo o resto que se esboça nestes dias, ainda pior do que o seu discurso de campanha? Tomada à força da Groenlândia e do Canal do Panamá; a expulsão dos palestinos de Gaza e a posse do território; a determinação com que avança sobre aliados… Uma das hipóteses de Blake é que tudo isso é um jogo diversionista. Digamos que sim. Mas aí cumpre perguntar, como faria o poeta Ascenso Ferreira: “Para quê?”

Se chegássemos à conclusão de que é “para nada”, a hipótese do simples diversionismo seria a menos provável. Afinal, trata-se do homem que está na ponta da maior máquina de guerra do mundo. E as mínimas coisas que faz nunca são irrelevantes. Os preços se movem mundo afora em razão do seu delírio. De inequívoco, temos a caça aos imigrantes, o perdão que concedeu a criminosos que invadiram o Capitólio, estimulados por ele mesmo, e um norte moral: “Se você estiver descontente com algum governo que não açule seus ódios, vá lá a faça você mesmo o que pensa ser certo”.

noticia por : UOL

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