30 de janeiro de 2025 - 14:12

Ação contra Alcolumbre sobre jatinho patina sem dados de empresa beneficiada por emenda

Uma ação aberta contra o senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) no TRE (Tribunal Regional Eleitoral) do Amapá por suposto abuso de poder econômico deve ser arquivada por falta de informações prestadas à Justiça.

O caso investiga se Alcolumbre usou dois jatinhos da empresa Saúde Link, beneficiada com recursos de emenda do parlamentar, durante a sua campanha ao Senado em 2022, sem declarar na prestação de contas eleitorais.

A empresa, no entanto, afirmou à Justiça que não tem a lista de passageiros que voaram em suas aeronaves no período investigado. Argumentou, além disso, que aviões particulares não estão sujeitos a requisitos de documentação e registro de passageiros estabelecidos pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil).

“Por essa razão, as informações e documentos solicitados não podem ser apresentados, uma vez que o mesmo não mais detém e/ou está na posse dos mesmos”, respondeu a empresa.

Alcolumbre é favorito para vencer a eleição para a presidência do Senado, no dia 1º de fevereiro. O parlamentar do Amapá já presidiu a Casa de 2019 a 2020, quando passou a acumular influência política no Congresso e na distribuição de emendas parlamentares, principalmente para seu estado.

A investigação pelo uso dos aviões foi aberta a pedido de Rayssa Furlan (MDB), candidata derrotada por Alcolumbre na eleição de 2022. Ela acusou o parlamentar de usar os jatinhos, sem prestar contas em sua declaração de gastos, e pediu a cassação de seu mandato. O senador nega as acusações da adversária.

No processo, foram anexados documentos da FAB (Força Aérea Brasileira) que mostram rotas das aeronaves citadas, entre Macapá e Brasília, além de pouso e decolagem no aeródromo Hangar Comandante Salomão Alcolumbre, que pertence à família do senador.

Procurada, a assessoria de Alcolumbre afirmou que o senador não usou as aeronaves citadas no processo e que nenhuma de suas emendas parlamentares foi direcionada à Saúde Link.

A empresa foi responsável por executar o programa Mais Visão, iniciado em 2020 por um convênio do Governo do Amapá com a ONG Centro de Promoção Humana Frei Samarate, conhecida como Capuchinhos.

Uma publicação no portal do governo do estado afirma que o programa recebeu R$ 6,4 milhões em emendas de Alcolumbre. Neste caso, a verba indicada pelo senador é destinada ao órgão público responsável pela execução da ação —o Governo do Amapá.

Na mesma página, há também uma foto do senador com o então governador Waldez Góes, aliado do parlamentar e atual ministro da Integração e Desenvolvimento Regional do governo Lula (PT).

Em seu site oficial, o senador se intitula idealizador do Mais Visão, com registros de sua visita a um posto de atendimento no município de Tartarugalzinho (AP). O programa também foi explorado em seu material de campanha em 2022.

Além disso, a publicação afirma que a implantação do Mais Visão “só se tornou realidade por causa da destinação das emendas parlamentares do senador Davi para o projeto”.

“Eu costumo dizer que o Mais Visão é um dos meus sonhos mais especiais, que se tornaram realidade para o estado porque ele devolve para as pessoas a visão, a autoestima, a autoconfiança, a independência e a autonomia”, afirma o senador no texto.

O Mais Visão também se tornou alvo de uma investigação do Ministério Público do Amapá depois que pacientes perderam o globo ocular devido a uma infecção adquirida num mutirão de cirurgias do programa. De 141 pessoas atendidas, 104 apresentaram complicações pós-operatórias, incluindo 40 casos graves.

Em setembro do ano passado, o juiz relator do caso no TRE do Amapá, Carlos Augusto Tork, afirmou que “várias diligências foram determinadas com vistas à obtenção das informações requeridas nos autos da ação”.

Ele acrescentou que, apesar dos esforços da Justiça, “várias delas mostraram-se infrutíferas pela impossibilidade de fornecimento dos dados ou por inércia dos órgãos oficiados”.

A Anac afirmou, no processo, que a lista de passageiros não é requerida a operadores privados e que as áreas técnicas da agência não mantêm informações nominais sobre passageiros transportados, “não sendo possível atender” à solicitação feita pelo juiz do caso.

A Infraero também respondeu que não tinha as informações, pois, conforme regulamentação da Anac, “os

administradores de aeroportos não têm a obrigação de realizar a identificação civil de passageiros”.

O hangar do estado do Amapá e o Aeroporto Internacional de Brasília também informaram não ter imagens das câmeras que pudessem registrar o pouso e desembarque dos passageiros das aeronaves.

O Ministério Público Eleitoral apontou que a demora e a falta de provas não justificavam “o prolongamento da instrução processual, sobretudo diante da necessidade de observância da razoável duração do processo eleitoral”, de acordo com o juiz.

No dia 13 de dezembro, Tork determinou a inclusão da ação na “primeira sessão” após o recesso do tribunal, “a ser realizada no mês de fevereiro de 2025”. Ainda não há data definida para o julgamento, mas ela ocorrerá após a eleição da presidência no Senado, da qual Alcolumbre deve sair vitorioso.

A assessoria de Alcolumbre afirmou que ainda aguardava a confirmação do tribunal sobre uma data para o julgamento.

Nos autos do processo, a defesa do senador declarou que o aeródromo Salomão Alcolumbre não é utilizado exclusivamente pela família do parlamentar e que, em busca no Instagram, “é notável a presença de centenas de fotografias, quase todas relacionadas à prática de paraquedismo” no local.

Também afirmou que já foram realizadas dezenas de diligências, sem que fosse apontado sequer um indício do suposto uso indevido e que, “diante da não obrigatoriedade de lista de passageiros por parte da empresa, enquanto operadora privada, o pedido se mostra também inócuo”.

“Não há qualquer prova ou indício de utilização de avião pelo candidato Davi”, disse.

A empresa e o governo do estado não responderam aos contatos da Folha, feitos por email e por telefone.

No processo, a defesa da Saúde Link afirmou que a exigência de uma prova impossível de ser produzida, em razão de ela não existir, “afasta qualquer possibilidade de responsabilização ou mesmo condenação pelo crime de desobediência de ordem judicial”.

noticia por : UOL

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