20 de janeiro de 2025 - 9:15

A posse de Donald Trump: como o presidente dos EUA quer mudar a economia, e os efeitos para o Brasil


Republicano visa favorecer a atividade doméstica e limitar a concorrência estrangeira. Primeiras ordens devem impactar a imigração, o setor de energia e a relação com parceiros comerciais. O ex-presidente e então candidato à presidência Donald Trump participa de debate da ABC News, em setembro
Win Mcnamee/Getty Images via AFP
A posse do presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, acontece nesta segunda-feira (20), e já deve trazer consigo uma série de medidas que o republicano vai adotar em seu segundo mandato.
Além dos discursos e do cerimonial de troca da Presidência, o dia também terá os primeiros decretos presidenciais, que prometem mudanças relevantes de política econômica dos EUA — e que transbordam efeitos ao redor do planeta, incluindo o Brasil.
Trump retorna à Casa Branca com um discurso protecionista, visando favorecer a atividade doméstica e limitar a concorrência estrangeira. Embora setores importantes da economia norte-americana possam se fortalecer, há uma clara pressão inflacionária.
O presidente promete mudanças nas políticas de imigração, no setor de energia e nas relações comerciais da maior economia do mundo. Trump espera um aumento de produtividade das empresas, mas há o risco de aumento nos preços pela redução da mão de obra ou pelo efeito de muitas taxas contra concorrentes de fora.
Sendo esse o cenário, o Federal Reserve (Fed) terá mais dificuldade de controlar a inflação e poderá ser obrigado a interromper o ciclo de queda das taxas de juros por lá — ou até mesmo aumentá-las.
E juros mais altos nos EUA aumentam a rentabilidade dos títulos públicos do país, considerados os mais seguros do mundo. Com o fluxo de dinheiro voltado para lá, o dólar se valoriza frente a outras moedas.
Para o Brasil, um real mais fraco significa inflação mais alta. Com juros elevados no exterior, o Banco Central (BC) pode precisar subir a taxa básica de juros brasileira (ou mantê-la alta) para evitar a saída de investidores do país.
Por fim, há mudanças importantes no comércio exterior, já que os EUA são o nosso segundo maior parceiro comercial.
Entenda abaixo como as medidas podem afetar o Brasil, e o que esperar para os próximos meses.
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Quais são os impactos para o Brasil?
De maneira geral, as medidas econômicas previstas para o mandato do republicano têm caráter inflacionário e devem causar uma série de efeitos por aqui, principalmente em termos de preços e juros.
Entre aquelas de maior impacto estão o aumento de tarifas para produtos importados, a redução de impostos domésticos, o apoio à indústria norte-americana e a oposição a incentivos para a transição energética.
🏭Tarifaço e apoio à indústria norte-americana
Parte dos efeitos, segundo especialistas, viria principalmente das medidas que envolvem as relações comerciais entre o Brasil e os EUA, com impactos diretos e indiretos na inflação e na indústria brasileira.
A intenção de Trump, de aumentar as tarifas para produtos importados, pode atingir os exportadores brasileiros. A proposta inicial é impor uma alíquota de 10% a 20% sobre todas as importações, o que afetaria todos os parceiros comerciais dos EUA.
Em dezembro, durante sua primeira coletiva de imprensa após a vitória nas eleições de 2024, Trump ameaçou cobrar do Brasil “a mesma coisa” que o país cobra, afirmando que o valor era muito alto.
Embora a ameaça tarifária seja considerada uma estratégia antiga do republicano para beneficiar os EUA em negociações bilaterais, a possível implementação da medida ainda não está descartada.
De um lado, há o impacto na balança comercial brasileira. Em 2024, os EUA compraram mais de US$ 40 bilhões em produtos brasileiros, ficando atrás apenas da China (US$ 94 bilhões). Um aumento das tarifas pode tornar os produtos brasileiros menos competitivos, reduzindo as exportações.
A balança comercial registrou superávit de US$ 74,55 bilhões no ano passado, o que ajudou a conter uma alta expressiva de 27% do dólar. Sem tantas exportações, a situação seria ainda mais preocupante, pois as vendas para o exterior aumentam a oferta de dólares no país.
Assim, caso o bloqueio se concretize sob Trump, a inflação brasileira pode sofrer nova pressão, tanto pela menor entrada de dólares no país quanto pelo possível repasse de preços pelos produtores devido ao aumento dos custos com um câmbio desfavorável.
Além disso, o professor de ciência política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Lucas Pereira Rezende, aponta os impactos indiretos da medida, por meio da sobretaxação dos produtos chineses. Trump propõe impor tarifas de 60% ou mais sobre os produtos importados da China.
O professor explica que essa medida poderia levar a China a buscar outros mercados, encontrando no Brasil uma saída para seu comércio exterior, afetando nossa indústria e varejo.
“É importante que, nesse momento, o Brasil também comece a pensar em políticas que fomentem a reindustrialização e a diminuição da dependência de produtos industrializados externos”, diz Rezende.
✂️ Cortes de impostos domésticos
Outro ponto de atenção, segundo especialistas, é a promessa de Trump de reduzir ou limitar os impostos domésticos para incentivar a indústria e a atividade econômica nos EUA.
Esse cenário pode reduzir a arrecadação do país e, dependendo de como for implementado, gerar novas preocupações no mercado financeiro sobre a capacidade de os EUA de cumprir com o pagamento de sua dívida.
Na prática, isso pode levar os investidores a exigir um prêmio maior (em suma, juros mais altos) e pressionar o Federal Reserve (Fed) voltar a aumentar as taxas americanas. Os países emergentes, como o Brasil, ficam menos atrativos, o que pode ser mais um gatilho de saída de dólares do país.
Uma desvalorização ainda mais intensa do real pode exigir que o BC também seja mais agressivo para ajustar para cima a taxa básica de juros (Selic). Com Trump no radar (e problemas internos com a incerteza sobre as contas públicas), o mercado financeiro brasileiro já espera que a Selic termine este ano na casa dos 15%.
A projeção é de uma redução para 12% ao ano em 2026, e para 10,25% em 2027. São ao menos três anos com juros acima de dois dígitos, que podem ser uma trava para o crescimento da economia brasileira, com impactos no mercado de trabalho.
⚡ Mudanças no mercado de energia
Por fim, outra medida preocupante é o fim das restrições para o mercado de petróleo, gás natural e carvão, além do aumento da produção de energia em todas as fontes, incluindo a nuclear.
Para especialistas, essa intenção dos Estados Unidos pode trazer oportunidades para o Brasil, mas também preocupações sobre os mecanismos internacionais para a transição energética.
Do lado positivo, essa mudança pode abrir espaço para uma maior liderança do Brasil na agenda climática, uma vez que o país tem investido cada vez mais em energias renováveis. Além disso, pode fortalecer a parceria energética com os EUA, beneficiando o setor de óleo e gás.
Por outro lado, há preocupações sobre possíveis alterações nas políticas comerciais, como o aumento de tarifas sobre importados, e uma menor colaboração internacional.
Segundo Rezende, da UFMG, o governo Trump pode dificultar mecanismos internacionais de transição energética, como o mercado de carbono.
“Além dos impactos econômicos derivados das mudanças climáticas que já estamos sentindo agora, como o aumento da inflação de alguns alimentos, podem surgir novos efeitos no curto, médio e longo prazo devido a uma mudança de postura por parte do governo dos EUA”, diz o professor.
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Mas será que o Trump conseguirá implementar tudo o que deseja?
Segundo especialistas, muitas das propostas do plano econômico do republicano são parte de uma retórica política, mas é preciso considerar que Trump está mais poderoso em um segundo mandato, ajudado pela nova “onda vermelha” vista nas eleições do ano passado.
“A vitória de Trump não foi isolada, mas acompanhada de uma ampla conquista republicana nas duas casas do Congresso”, explica o vice-presidente executivo do Grupo Travelex Confidence, João Manuel Freitas.
“Esse domínio republicano traz implicações significativas para a economia global”, completa o executivo.
Na prática, isso significa que as políticas propostas por Trump podem ter um apoio maior por parte do Congresso, facilitando a aprovação dessas medidas.
“É um cenário bastante diferente do Trump 1, que tinha políticas que eventualmente eram barradas pela Suprema Corte ou pelo Congresso. Isso agora pode não acontecer da mesma forma nesse segundo mandato”, diz Rezende, da UFMG.
O professor acrescenta que o republicano pode tentar passar boa parte das medidas impopulares já em 2025, aproveitando a popularidade das eleições, que ainda está bastante recente no país. “Só então o Brasil vai conseguir se reposicionar e entender o que de fato lhe impactará diretamente”, completa.
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Fonte: G1

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